edição 37 | outubro de 2009
temas:  os quatro elementos (água, fogo, terra, ar) ou os signos | pés | aquele beijo que te dei

 


©cristina carriconde

 

4 poemas
valéria tarelho

 

 

ornamental, meu caro cousteau

 

se é impulso

caso pensado

passo em falso

des[a]tino

 

sei que

te sigo

 

te caço

entre astros

e o mínimo rastro

que pesco

no horóscopo

 

[por via das dúvidas

tasquei um asterisco

no teu signo]

 

um dia desses

[de fuga]

te fisgo

 

te falo falácias

te faço um filho

te filmo entre quatro

paredes de vidro

 

fish [frito]

do meu

aquário

 

 

 

 

pisces

 

o sonho

em cores

aromas

sabores

o (a)provo

— cru —

nas madrugadas

[drogadas

de fome]

 

ele, peixe fresco

:

nada

 

 

 

 

taurus

 

regida por vênus

dou olés

em toureiros

e alôs

aos tarados

:

afrodite se quiser

 

 

 

 

leo

 

porte de leão

olhar de lince

amigo da onça

em pele de gato

 

um tigre dois tigres

três tragos

(es)puma

se contrariado

 

urra & unha

o felino em pessoa

 

por quem babo

deito rolo

abano o rabo

 

 

 

 

 

©cristina carriconde

 

 

novembro
virna teixeira

Éramos três: eu, uma poeta e um cirurgião. Sentados na varanda de um prédio histórico, de onde se avistava um hospital. A poeta era pálida, misteriosa. O cirurgião era geminiano, gesticulava muito e usava roupas de palhaço. De repente uma enfermeira apareceu na porta. Usava uma roupa muito justa, scarpins brancos e um chapeuzinho. Parecia aflita. Seguimos a enfermeira no interior do prédio até um quarto, com pé direito muito alto. Havia apenas um leito e um biombo. Uma mulher, loira e velha, agonizava. Estava nua, um corpo magro com drenos e sondas e sangrava profusamente. Tinha um cicatriz cirúrgica no abdome.

 

O cirurgião de repente ficou muito sério, um homem sisudo de avental. Era grave. Pediu que instalasse fluidos e medicamentos, mas foi inútil. Examinei as pupilas e constatei o óbito. A poeta ficou à distância, os olhos baixos, em silêncio.

 

Deixamos o cirurgião com o corpo e passamos ao cômodo seguinte. Havia uma escada que conduzia a um átrio. O átrio era de mármore e percebia-se pequenas colunas e pedestais com frascos. Era uma perfumaria. Uma mulher idosa, muito elegante, me entregou um recipiente escuro com uma tampa pesada. "Aspire isto", disse. Era iodo. Aspirei várias vezes. A poeta também.  Em seguida, entregou outro frasco. Um frasco bonito e delicado, com um perfume doce, de odor muito agradável. O perfume chamava-se "much deep feelings". A fragância era duradoura, regenerava memórias antigas. O rosto da poeta tornou-se emotivo, enevoado. Ela sorria. Acordei no meio do eclipse. A lua em trânsito, em conjunção com mercúrio, flutuava na casa XII.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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