edição 11 | outubro de 2006
lugar

 

enfim nós
adelaide do julinho

final do enredo:
eu & meu dedo

                    Pra Mariza Lourenço

 

 

joão miami
adriana oliveira

"Na hora de pedir emprestado o robô que limpa a piscina é Deus no céu e o João Miami na terra". Dona Vitória disse isso olhando para Helena, a divorciada  da casa amarela.  Já está acostumada a defender João Miami das piadas maldosas dos vizinhos. Acha todos uns interesseiros. Falavam dele pelas costas, mas estavam sempre lá, no aeroporto, esperando os presentes.

 

João Miami chegou triunfante, distribuindo as sacolas.  No caminho até a sua casa, ele repetiu o discurso: "Lá é outro mundo mesmo, tudo limpo e organizado. As leis são respeitadas e o povo é muito educado. Fora os cubanos, que gritam muito".

 

Dona Vitória escuta essa conversa há quatro anos. Desde que Paula, filha de João, casou-se com um empresário americano. Duas vezes por ano, ela manda as passagens para o pai ir visitá-los. O genro insiste para que João vá morar com eles. Ele agradece o convite, mas não aceita, tem muita gente esperando por ele. 

 

Enquanto João Miami faz turismo, é Dona Vitória quem cuida da sua casa. Molha as plantas, abre as janelas, tira o pó e coloca um perfume nos travesseiros para marcar a sua presença. Ele retribui os favores com cremes para a pele, maquiagem e os mais modernos produtos de limpeza dos Estados Unidos.

 

Como sempre, ele chega em casa e vai para o chuveiro, enquanto Dona Vitória desfaz a sua mala, separando a roupa suja. Em um dos compartimentos, está um pacotinho embrulhado com papel vermelho brilhoso. Ela não resiste e abre o pacote, com todo o cuidado. É uma calcinha com estampa de oncinha, não muito pequena.   

 

Desde que João Miami tinha ficado viúvo, ela esperava por aquele momento.  Estava tudo muito claro. Ele deixou a calcinha ali, na sua cara, para que ela a vestisse.

 

Quando ele saiu do banheiro, usando uma camiseta e a nova  calça de moleton, encontrou Dona Vitória esparramada na cama, só de calcinha. Sentindo-se na obrigação, tirou a roupa também.     

 

Dona Vitória revelou-se uma surpresa. Tantos anos sem transar, a transformaram em uma "sex machine".

 

João Miami, numa mistura de cansaço e êxtase, adormeceu. A menos de uma quadra dali, na casa amarela, Helena espera ansiosa pela sua encomenda.

     

 

 

 

 

um
andréa del fuego
 

Existe um único sentimento, 

 

que dele saem outros. Feito a ilusão das sete cores que traz o espectro solar, essa evocação obsedante. De modo que o amor é transparente, luz não é cor. De modo que amor não é do jeito que chamamos, ele não vem. Ele fica lá. Amor é uma distância, o intervalo entre nós e seu centro. Ficamos longe porque se orbita sendo menor que a força. Estamos em órbita pra seguir o ritmo, não pra ditá-lo. Se amar, não se mova.

 

 

 

 

 

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